Hoje é a véspera de São João. Mas o Nordeste vive uma ‘festa’ diferente! Por Nonato Guedes.

Nonato Guedes

Nem parece que é São João no Nordeste. Sim, porque é aqui onde a tradição “joanina” ou “junina” é mais forte, com fogueiras ardendo, quadrilhas dançando forró pé de serra, mesa farta de comidas típicas, alegria em banda de lata, gente saindo pelo “ladrão” nas vilas, cidades e capitais. Infelizmente, a pandemia do coronavírus mudou tudo. Em vez de shows artísticos em Parques do Povo como o de Campina Grande ou o de Caruaru, Pernambuco, ocorrem “lives”, ou seja, transmissões de apresentações de artistas pela internet, sem o contato físico, sem as aglomerações. Tudo em nome da saúde e da vida.

A verdade é que o Nordeste está diferente, estranho. A cantora Elba Ramalho postou em rede social imagem sua a caminho de Campina Grande, com máscara no rosto e jeito desanimado, no saguão de aeroporto. E escreveu: “Aeroporto quase vazio e nós, aventureiros disfarçados, não estamos distraídos, mas protegidos!! Campina Grande me leva para sua festa junina que também é minha, é nossa. Deus no Comando!”. Elba tem participado de lives no YouTube que atraem o público apaixonado pelas festas juninas. Campina Grande, na Paraíba, e Caruaru, no vizinho Pernambuco, são duas das cidades mais afetadas pelo São João atípico de 2020. Os prejuízos são incalculáveis, uma vez que os folguedos juninos constituem fonte de renda para um sem número de pessoas com atividades formais e informais no comércio, além de mobilizar dezenas de artistas, conjuntos musicais, bandas de forró que coloriam os sertões até 2019.

Evaristo Eduardo de Miranda, no “Guia de Curiosidades Católicas”, um manual bem humorado sobre coisas e causos do folclore, brinca que a origem das festas juninas é de Caruaru para os pernambucanos ou de Campina Grande para os paraibanos. “Na realidade – descreve – as festas juninas ou joaninas são uma celebração religiosa europeia tradicional do mês de junho. A denominação de festas joaninas teve origem nos países europeus católicos desde o século IV. Quando chegou ao Brasil, no século XVI, o nome foi progressivamente modificado para junina. Elas representam uma das mais expressivas manifestações culturais brasileiras, principalmente no Nordeste. Nelas, são festejados três grandes santos católicos: São João (amanhã, 24), São Pedro (29 de junho) e Santo Antônio (13 de junho). Inicialmente eram chamadas de festas joaninas, dado o seu vínculo com a Festa de São João, o único santo católico festejado no dia do seu nascimento e não de sua morte”.

As festas juninas, normalmente, são feriados municipais em muitas localidades do Brasil. São divididas em dois tipos: as festas da Região Nordeste e as festas do Brasil caipira nos Estados de São Paulo, Paraná (norte), Minas Gerais (sobretudo na parte sul) e Goiás. No Nordeste do Brasil, por ser em parte uma região semi-árida, os agricultores, principalmente do agreste, agradecem a São Pedro e a São João as chuvas e o sucesso nas colheitas. São João é a maior festa religiosa e popular de toda a Região. O arraial junino é um espaço sagrado, como uma aldeia temporária e só existe durante as comemorações. É enfeitado com bandeirinhas, portais de bambu, barracas de comidas e bebidas típicas, brincadeiras, jogos, dança, músicas e muita diversão. As crianças se vestem de caipira ou de lavrador, usam chapéus de palha e expressam um jeito estilizado de mostrar o homem da roça. Pintam no rosto traços de barba e bigode. Nesse pequeno vilarejo do arraial, nessa quermesse, tem sempre uma “igreja” e um “padre”. E uma das brincadeiras mais festejadas é o casamento na roça.

O que mais se vê nos arraiais são compadres e comadres, unidos numa fraternidade acima do sangue, dada pelo batizado de seus afilhados. Evaristo Eduardo de Miranda informa que há algo de utópico, de monárquico e de milenarista no arraial, cuja etimologia latina evoca o a-regalis, o relativo ao rei ou à dignidade do rei. Revela, ainda, que a fogueira de São João é o maior símbolo das comemorações juninas. Conforme a tradição católica, a fogueira joanina tem suas raízes em um trato feito pelas primas Isabel e Maria. Para avisar Maria sobre o nascimento de São João Batista e assim ter seu auxílio após o parto, Isabel acendeu uma fogueira sobre um monte. Essa fogueira significava a boa-nova do nascimento de um profeta e confirmava a gravidez sobrenatural de Maria. O fogo está associado a João – o Batista, um imersor nas águas. Essa aparente antinomia entre fogo e água associados à mesma pessoa delata a superação das contradições e uma harmonia, messiânica. João batizava com água e advertiu que Jesus batizaria com o fogo, o fogo purificador e inspirador do Espírito Santo.

Este ano, por causa da pandemia, está proibido acender fogueiras. Mas dá pra notar que as festas juninas têm muita história interessante, muito folclore bonito. Por isso, são atraentes, dão um colorido especial ao Nordeste, lotam parques e praças. Isso, quando não há pandemia. Mas, como se diz por aí, esse “coronavírus” vai passar. Deus queira que passe logo!!!

Os Guedes

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